segunda-feira, 24 de maio de 2010

O ANIMAL ESCRITO

“Uma incursão na história da literatura ocidental permite-nos também rastrear uma possível história literária dos animais. De Esopo (620-560 a. C.), Aristóteles (384 - 322 a. C.) e Plínio o Velho (23-79 d. C.), passando por Isidoro de Sevilha (560 – 636 d. C.) e os bestiários medievais, até os relatos de viajantes do século XVI e os inúmeros bestiários modernos e contemporâneos de distintas nacionalidades, os animais nunca deixaram de se inscrever de maneira incisiva no imaginário poético do Ocidente tomados geralmente como o estranho por excelência, como o que só pode ser apreendido a partir de sua relação com o humano, os animais sofreram, ao longo dos séculos e milênios, múltiplas representações e interpretações, convertendo-se não apenas em signos vivos daquilo que sempre escapa a nossa compreensão, mas também no nosso ‘possível ilimitado’, visto que assumem inúmeros registros, formas, intensidades e papéis em nossa imaginação.

Se, na Antiguidade clássica, coube a Esopo, com suas fábulas moralizantes, a tarefa de levar os animais (convertidos em metáforas do humano) para o campo exclusivo da ficção, inaugurando uma vertente zooliterária que atravessará os séculos com seu tom sentencioso e proverbial, foi A história dos animais, de Aristóteles, o primeiro grande compêndio científico-literário sobre o reino zoológico, no qual os animais foram tratados como animais, a partir de uma abordagem minuciosa que conjuga pesquisa, esforço taxonômico e imaginação criadora. Pode-se dizer que Aristóteles inaugura, assim, não apenas a tradição enciclopédica a que se filiarão Plínio, o Velho, Santo Isidoro e Lineu, como também a dos catálogos descritivos de animais reais e fantásticos, conhecidos como bestiários, que proliferarão na Europa a partir da Idade Média.”

(Do livro O animal escrito — Um olhar sobre a zooliteratura contemporânea, de Maria Esther Maciel. Bauru: Lumme Editor, 2008.)

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