segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

DIÁRIO DE UM EX-FUMANTE


Caros, eu deixei de fumar há exatamente um ano e três semanas. “Existe vida após o cigarro?”, perguntou-me um amigo, certa vez. Sim, existe. Você pode viver, e bem, sem nicotina no pulmão. Porém, é preciso substituir o vício por outra coisa (os primeiros quatro meses de abstinência são os mais dolorosos). Em meu caso, troquei o velho Benson and Hedges mentolado, que consumi durante quase 30 anos, por duas trufas de chocolate por dia, e um número incalculável de pudins de baunilha com calda de caramelo, toda semana. Engordei quase quinze quilos (como sou magro por formação genética, isso não foi nenhum problema). Porém, acredito que eu teria voltado a fumar, se não praticasse regularmente Espada de Tai Chi Chuan e Aikidô, artes marciais que exigem um certo preparo físico. Sou apaixonado por Wushu desde criança, tenho fascínio pela coreografia dessas técnicas, por sua beleza rítmica, pela construção de cada movimento, que se transforma em outro num jogo sensível e inteligente que envolve todo o corpo, não só os pés e as mãos. O objetivo de me desenvolver nessas artes foi mais forte do que o desejo de fumar; eu tinha, afinal, uma motivação. Isto nada tem a ver com a vontade de viver mais (75 anos para mim está de bom tamanho, nunca gostei de fazer hora extra), com o culto à saúde (nesse caso, sou mais favorável ao princípio do prazer) ou obsessão pelo corpo (conheço minhas limitações e sei que nunca terei músculos de Bruce Lee). Também não se deve a convicções religiosas ou filosóficas (o budismo condena o tabagismo, mas é tolerante com quem não consegue abandonar o vício), e muito menos devido à pressão imbecil do politicamente correto (sou do contra, logo, a minha predisposição natural seria a de fumar constantemente em locais públicos para contrariar a norma. Como dizia o outro, “é proibido proibir”). O motivo real de minha desistência do tabaco é este: gosto de praticar artes marciais; tenho prazer em executar esses movimentos, que imitam os gestos dos animais, os fenômenos da natureza e se relacionam a uma visão de mundo mais profunda do que se imagina (leiam os comentários de Confúcio ao I Ching, e depois me contem o que entenderam). Sou mais feliz hoje, sem o cigarro. Mas não quero fazer sermão para convencer ninguém. Todo mundo tem o direito de se matar em paz (e eu respeito isso; cada vez encontro menos motivos para continuar aqui). Porém, se você quer parar de fumar e não consegue, dou apenas essa dica: troque o cigarro por outra coisa mais prazerosa. Caso contrário, será extremamente difícil abandonar o vício.

2 comentários:

  1. Seu texto me cai como orvalho (apagando a brasa enquanto o lia). Infelizmente não tenho nenhuma predisposição a quaisquer esportes... As trufas, essas sim, criaram motivo. Creio q as duas coisas mais difíceis serão desacompanhar a cerveja (q barra!) e a poesia (só consigo pensar em meio a fumaça... vou tentar um incenso).
    Grande abraço,
    Sidnei

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  2. Caro Sidnei, nos primeiros meses de abstinência, cortei o café, álcool, carnes muito temperadas e comidas apimentadas (e enchi a cara de doces). Depois de algum tempo, reintroduzi o café, a cerveja e todo tipo de alimento, sem problema algum. Você pode substituir o cigarro por qualquer outra coisa que te dê satisfação. As escolhas, aí, são pessoais. Pense bem, e logo você encontrará uma resposta! De todo modo, atividade física e alimentação saudável ajudam muito a combater o tabagismo. Abraço,

    CD

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