quarta-feira, 18 de março de 2009

UM ENSAIO DE EDUARDO MILÁN (IV)

Ante esse panorama entrópico que resulta da emergência de todas as formas por considerá-las possíveis neste momento histórico e a utilização ideológica da narração como substituto simulado da história, cabe fazer, pelo menos, uma pergunta: sob que ótica ou sob que padrão crítico pode julgar-se, hoje em dia, um poema? A emergência de todas as formas interagindo, aliada a uma negação do tempo e da história, supõe, à primeira vista, uma forma de inocência que, por sua vez, comporta um tipo de olhar inédito em relação à origem. Porém, uma das características do poeta moderno, isto já se disse mil vezes, é sua situação paradoxal frente à modernidade: ao mesmo tempo que é um agudo crítico da modernidade, recupera para si seu legado mais válido, que é, justamente, a crítica, tanto de sua linguagem como do mundo. É isto que, em última instância, está em jogo agora: o esquecimento ou a permanência da função crítica do poeta. A meu modo de ver, frente ao impasse atual por que atravessa a poesia latino-americana, o poeta deve ser mais lúcido do que nunca. A batalha contra o novo — como gostava de dizer Leminski — é uma guerra perdida. E o novo passa hoje por uma revalorização do passado. Revalorização, não retorno. E revalorização implica uma re-historicização, um dar ao César do passado o que é do César do presente. Quero dizer: a única possibilidade de re-historicizar o passado é vê-lo com os olhos de hoje, posição muito contrária à simulação pós-moderna, que pretende, a pretexto da intemporalidade, ver o passado com os olhos do passado, o que, em última instância, implica o fim da tradição. Esta última posição, no que diz respeito à poesia, tem a ver com a utilização das formas do passado. A utilização de uma forma como o soneto, por exemplo, tal qual era usado por Quevedo ou por Lope de Vega, pode constituir, em algum lugar, uma maneira de homenagear uma forma em seu momento de esplendor. Porém, certamente constitui, sem dúvida, para mim, mais uma maneira de homenagear uma fachada do que uma forma integral. Só posso argumentar em relação ao que foi dito antes com uma pergunta: se a vida é imprevisível, incerta e aleatória, por que deve a poesia representar uma forma de máxima estabilidade?

(CONTINUA)

Nenhum comentário:

Postar um comentário